Dom Pedro II, quem diria, veio a Castro

Dom Pedro II, quem diria, veio a Castro

Com Helcio Kovaleski
(Republicação)

Em sua história mais que tricentenária, Castro pode orgulhar-se de ter sido uma das nove cidades paranaenses que tiveram o privilégio de receber a visita de um imperador. Foi durante a vinda de Dom Pedro II à então Província do Paraná, em maio de 1880, acompanhado da imperatriz Dona Teresa Cristina, para inaugurar os trabalhos de construção da Estrada de Ferro Paranaguá-Curitiba.

A comitiva imperial chegou a Castro em 28 de maio e permaneceu na cidade até o dia 30. Relatos da época, publicados no Jornal do Commercio, dão conta que Dom Pedro II foi recebido pelo juiz Dr. Manuel da Cunha Lopes Vasconcelos e passou pela Chácara Bailly – que sedia uma imponente casa originalmente feita de taipa, construída em 1870, hoje localizada no Jardim das Nações.

Segundo conta Rosa Ribeiro, médica oftalmologista e historiadora autodidata, que colheu informações da visita de D. Pedro II a Castro em jornais da época e no diário do monarca, publicado no Anuário do Museu Imperial de Petrópolis (RJ), em 28 de maio a comitiva imperial saiu de Ponta Grossa com direção a Castro. A baronesa de Tibagi de Palmeira colocou à disposição do imperador e da imperatriz “grande berlinda puxada por quatro cavalos”.

É o próprio Dom Pedro II quem relata como foi a viagem do trecho Ponta Grossa-Castro. “Almocei às 06 e meia, e às sete horas partimos de Ponta Grossa para Castro. O caminho é bonito. O major Agnez deu à Imperatriz duas flores de campo muito bonitas. A aproximação de Castro me agradou. Colina com árvores e algumas bonitas, grande açude ao lado da estrada. Atravessamos diversos lajeados”, relata o imperador.

A comitiva chegou a Castro “à uma hora da tarde”. Conforme conta Rosa Ribeiro, o imperador e a imperatriz foram recebidos na entrada da cidade “por uma comitiva de homens ilustres, entre eles o comendador Manoel Inácio do Canto e Silva, neto do sargento-mor José Felix da Silva, aquele do ‘Drama da Fazenda Fortaleza’”, e ficaram hospedados na casa do juiz Manuel da Cunha Lopes Vasconcelos, “que tem uma livraria pública em sua casa com boas obras que empresta a pedido por escrito”.

Segundo o Jornal do Commercio noticiou à época, “em Castro se acham as maiores fortunas da província”. “A exportação de Castro consiste em erva-mate, gado para Curitiba e para o litoral e principalmente para a Fera de Sorocaba [SP]”.

Doação

Durante sua estada na cidade, Dom Pedro II fez uma doação de 1,5 mil réis, sendo 500 para a igreja-matriz; 500 para as obras de uma escola primária; 300 para esmolas; e 200 para a Vila de Tibagi. O imperador doou também um jogo métrico de pesos e medidas, e a imperatriz doou paramentos à igreja. Segundo Rosa Ribeiro, esses objetos encontram-se, atualmente, no Museu do Tropeiro.

No dia da sua chegada a Castro, Dom Pedro II conta que ganhou “do Firmiano velas de cera muito bem feitas, ele cria abelhas [sic]”. O jantar foi servido “às 03 horas” e, depois, o imperador visitou “a igreja que está em reforma, antiga matriz que grande ficará muito decente”, e a Câmara Municipal, que “com a cadeia embaixo não é má”. Em seguida, o passeio estendeu-se ao rio Iapó, onde Dom Pedro II notou que “a ponte de madeira está em mau estado e é caminho para São Paulo”. “O rio é piscoso e ao jantar me serviram o peixe tabarana. No passeio entrei no jardim onde vi uma bela figueira do antigo vigário Padre Damaso”, relata.

Chácara Bailly

Em seu diário, Dom Pedro II conta que conversou com “o francês José Bailly”, que lhe pareceu “conhecedor de agricultura”. “Ofereceu-me uma bandeira cuja haste é dos produtos vegetais de sua plantação como centeio, cevada, trigo, aveia, vinha, batata, etc. Deu-me duas garrafas de vinho feito por ele com dois cachos de uva americana. Talvez Bailly seja aproveitável, mandei-o ao ministro”, relata.

A visita à chácara Bailly aconteceu no sábado, 29 de maio. “Cinco horas. Acordei. O presidente informou-me bem do Bailly. Às 07 horas fui à sua propriedade, que veio com outros encontrar-me no caminho, que é mau nalguns lugares. Mostrou-me a aveia que colheu e a plantada está bem verdinha. Possui vacas e cento e tantos carneiros. Disse-me que são necessários 150 carneiros para estrumarem 01 acre. Quer vender a terra. Faz selas e tem 03 filhos”, diz Dom Pedro II. “Ouvi que a cidade tem duas bandas de musica [sic]. Castro tem ruas largas e direitas. Disseram-me que cai bastante geada aqui, mas o dia de ontem teve manhã fresca”, relata o imperador.

Estrada de ferro

O livro “D. Pedro II na Província do Paraná, 1880”, do escritor David Carneiro (Jornal Diário dos Campos, 15 jun. 1971, Acervo Casa da Memória), citado pela historiadora Isolde Maria Waldmann em seu blog (isoldemariawaldmann.blogspot.com.br), baseia-se em relatos de jornalistas que acompanharam a comitiva imperial durante a viagem. Conta o livro que a construção da estrada de ferro ligando Curitiba ao Porto de Paranaguá “era essencial para o desenvolvimento da Província e, desde 1865, falava-se na sua construção”. “Em junho de 1871, finalmente um contrato foi firmado entre o Barão de Mauá e concessionários para estudo da construção da aludida estrada. A notícia da presença do Imperador e da Imperatriz na Província do Paraná provocou um grande movimento nos preparativos de vestes de gala e vestidos para tão importante visita. Na época, era presidente da Província o Dr. Manoel Pinto de Souza Dantas Filho, baiano de nascimento e deputado provincial por várias vezes”, narra o livro.

Segundo historiadores, por influência do Barão de Mauá, em 1871, Dom Pedro II interessou-se pelo projeto da ferrovia. Dois anos depois, a obra entre Paranaguá e Morretes foi iniciada. Na sequência, representantes da Compagnie Génerale Chemins de Fér Brésilien, concessionária da ferrovia, convenceram Dom Pedro II a viajar ao Paraná para a inauguração, que deveria ocorrer na chegada do imperador a Paranaguá. No entanto, houve mudança na programação e a data foi transferida para 5 de junho, já já no retorno da viagem.

Conforme o relato de Rosa Ribeiro, o convite para a inauguração dos trabalhos da ferrovia tinha o seguinte texto: “A Compagnie Génerale Chemins de Fér Brésilien tem a honra de convidar a V. Excia. e sua Exma. família para assistir a [sic] inauguração dos trabalhos da Estrada de Ferro de Paranaguá a Curitiba que terá lugar nesta cidade, na Augusta presença de SS.MM. Imperiais, e ao mesmo tempo assistir ao copo d’água que a companhia terá a honra de oferecer. Paranaguá, 17 de maio de 1880”. A ferrovia propriamente dita, no entanto, só foi inaugurada em 1885, com a presença da princesa Isabel, filha do imperador.

Imperador ficou 20 dias no PR

Conforme narra David Carneiro no livro “D. Pedro II na Província do Paraná, 1880”, a comitiva liderada pelo imperador permaneceu na Província do Paraná durante 20 dias, onde ele fez questão de visitar escolas, comerciantes, beneficiadoras de erva-mate e artesãos. Para deslocar-se pela província, muitas carruagens foram emprestadas à comitiva imperial pela nobreza local.

O embarque no Rio de Janeiro – então capital federal – foi em 17 de maio, a bordo do paquete Rio Grande, comandado pelo capitão-de-fragata José Alvim. Faziam parte da comitiva, além de Dom Pedro II e da imperatriz Dona Teresa Cristina, a baronesa da Fonseca Costa; o camarista Visconde de Tamandaré; o vereador-conselheiro José Caetano de Andrade Pinto; o médico Barão de Maceió; o conselheiro Buarque de Macedo, ministro da alegria por parte de mais de mil pessoas presentes no ato de desembarque”. O programa definitivo e o itinerário foram publicados pela Gazeta de Notícias e previa o seguinte trajeto: dia 19, em Paranaguá; 20, em Antonina; 21, saída para Curitiba; 22, visitas aos principais estabelecimentos da capital, Museu Chácara Capanema e inauguração do novo hospital; e 23, visitas às colônias dos arredores de Curitiba.

A data de partida para a região dos Campos Gerais estava prevista para o dia 24, com pernoite em Campo Largo. O almoço, no dia 25, deveria ser em São Luiz do Purunã ou na ponte do Rio dos Papagaios, com pernoite em Palmeira. “A chegada na [sic] cidade de Ponta Grossa estava prevista para dia 26, com visita às colônias russo-alemãs no dia 27. Dia 28 seguiriam até a cidade de Castro. […] Dia 30 iniciarão a viagem de retorno para Paranaguá, através de Palmeira, Lapa e Curitiba”, relata o livro.

POR ONDE DOM PEDRO II PASSOU NO PR

17 de maio – saída do Rio de Janeiro
18 de maio – chegada a Paranaguá
20 de maio – viagem a Antonina
21 de maio – chegada a Curitiba
24 de maio – visita a Campo Largo
25 de maio – visita a Palmeira
26 de maio – viagem para Ponta Grossa
28 de maio – chegada a Castro
1 de junho – visita à Lapa
2 de junho – passagem por Araucária (na época, chamada de “Tindiquera”)
7 de junho – retorno para o Rio de Janeiro

(Fonte: Universidade Federal do Rio de Janeiro [UFRJ])

Fotos: Arquivo P1 News

Foto de destaque: Vista geral da Chácara Bailly, que recebeu a visita de Dom Pedro II, em maio de 1880.

Móveis antigos
Lavatório da época

Redação Página 1

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