Pandemia aquece setor e preço dispara
Luana Dias
Especial Página Um News
A pandemia do novo coronavírus foi responsável por retração histórica na economia e por desacelerar a maioria dos setores, quase que de forma global. Há exceções, no entanto. Enquanto estudos apontam redução na arrecadação e queda significativa nas vendas de setores importantes como o de automóveis, outros, como o da construção civil vive uma fase única, com demanda aquecida e novas contratações. Porém, nem mesmo o setor estando entre os que vivem a melhor fase, conseguiu escapar das conseqüências negativas que a pandemia gerou no mercado. Os empresários, construtores e profissionais desta área estão tendo que lidar com as demoras da indústria, atrasos na entrega e com alta de preços, sem precedentes.
Aline de Oliveira Garcia Pedroso tem visto essa mudança de comportamento no mercado e sente essas dificuldades bem de perto. Ela é engenheira civil e coordenadora de suprimentos em uma construtora da região. Segundo o que explicou à reportagem, profissionais como ela, que coordenam o abastecimento de materiais em grandes obras, estão inclusive tendo que mudar os fornecedores para assegurar a continuidade dos trabalhos. “Para garantir que obras não parem, estamos tendo que trocar de fornecedor de alguns materiais, e acabamos pagando mais caro por isso, mas é a forma que encontramos para garantir que o material chegue no tempo que precisamos. No começo da pandemia, ocorreram só algumas faltas e atrasos nas entregas, e agora sentimos também os efeitos nos preços, principalmente de dois a três meses para cá. Mas, não deixamos de enfrentar o problema da falta de alguns materiais e de atrasos, além disso, algumas indústrias nem estão pegando pedidos. Por exemplo, estamos com dificuldade pra encontrar piso cerâmico, algumas fábricas só estão aceitando pedido para o ano que vem, e, o mesmo ocorre com algumas cimenteiras”, explicou.
De acordo com a engenheira, muitos materiais sofreram alta nos preços, porém, alguns chamam mais atenção pelo alto percentual de aumento. É o caso, por exemplo, dos produtos feitos de PVC, como canos e tubos, dos parafusos e dos cabos de cobre, cujo preço subiu quase 70%. Cimento e seus derivados, como concreto e argamassa, ainda estão tendo elevação nos preços, e o aço no mês passado ficou 18% mais caro, e, neste teve mais uma alta de 15%.
Sobre essa fase atípica que vive a construção civil, a reportagem também conversou com o empresário do setor, Gregori Tochinski. Ele igualmente mencionou a alta expressiva de preços em produtos como os de fiação elétrica e produtos que levam cobre, que sofreram variação de até 80% para cima. “Foi uma das maiores altas que a gente já viu, há muito tempo não se via uma alta tão grande nos preços desses materiais, e quando acontecia a indústria avisava antes”, destacou.
O empresário também falou sobre a demora nas entregas e afirmou que vem tendo dificuldades para pedir e para receber alguns produtos. O jeito foi adaptar a rotina de compras de sua loja. “As indústrias não estão conseguindo cumprir os prazos, pedidos grande às vezes são entregues em até cinco vezes, e algumas indústrias não estão conseguindo pegar pedidos. Como vimos que a demanda estava muito alta e que essa questão da entrega começou a ficar difícil de administrar, começamos a antecipar as nossas compras”, explicou.
Fatores
Assim como ocorre com outros setores, que enfrentam demandas e oscilações incomuns de preços nesta época, no caso da construção civil também não há apenas um fator. Tanto Aline Pedroso, como Gregori Tochinski citaram diferentes razões para esse aquecimento de mercado, alta nos preços e falta ou atraso na entrega dos materiais.
Segundo a engenheira, é perceptível um número maior de vendas no varejo, onde a margem também é maior. As pessoas estariam ficando mais em casa, graças à pandemia, e assim, sendo mais motivadas a investir no lar, além disso, ainda foram incentivadas por questões de renda. “No início da pandemia os atrasos ocorriam porque as indústrias tiveram que dar uma parada, aí com menos mão de obra a produção e entrega acabavam atrasando. Nós também questionamos nossos fornecedores e a maioria falou que diminuiu a produção mas aumentou a demanda, e esse aumento pode estar relacionado à redução nas taxas de juros, mas também têm outros fatores e alguns casos específicos, como é o da resina usada para fazer o PVC, que só tem um produtor no país, e ele controla o mercado. Já o cobre é exportado, ou seja, sofre interferência do dólar, dos índices de moeda, assim como outros produtos que vêm de fora, como o alumínio”, destacou Aline.
O empresário Gregory Tochinski, que vende no varejo e atende diretamente ao consumidor final, também apontou fatores semelhantes, como a vinda de alguns materiais de estados como São Paulo, onde as indústrias tiveram atividades paralisadas por um tempo, e relacionou o aumento na demanda à cessão do auxílio emergencial, que aumentou o poder de compra das famílias, mas também vê nessa causa, possível inflacionamento de mercado. “A demanda aumentou devido a benefício do governo, muita gente investe em supérfluo, mas teve quem investiu no imóvel, que é o que sempre valoriza. Mas, com esse auxílio o próprio governo também acabou inflacionando o mercado. Além disso, existem os fatores especulatórios. Por exemplo, metade do reajuste do ferro é especulativo, e a outra é de fato aumento de custo”, explicou.
Gregory também contou que, na contramão da crise, sua empresa foi uma das que gerou vagas de trabalho ao longo da pandemia, justamente porque a demanda cresceu, exigindo mais de sua equipe. “Estávamos muito apreensivos no começo, com medo de fechar e sem saber como ficaríamos depois, mas o setor melhorou muito, aumentou as vendas em todas as lojas da área, por isso contratamos mais dois vendedores e duas pessoas para a produção”, finalizou.