Cooperativa-escola: novo modelo de ensino agrícola transforma educação do Paraná

Com mais agilidade administrativa e uma vivência prática do cooperativismo, os colégios agrícolas e florestais do Paraná estão qualificando o ensino técnico e fortalecendo o vínculo com o setor produtivo.

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AEN

Curitiba – Um trator quebrado no meio do plantio costumava significar semanas de espera para a manutenção no Colégio Agrícola da Lapa, com potenciais perdas na produção e atraso no cronograma de aulas. Agora, com a cooperativa-escola implantada, o conserto pode ser feito em pouco tempo com recursos próprios e decisões compartilhadas entre alunos, professores e direção.

O avanço é um dos reflexos da transformação que já abrange 21 dos 26 colégios agrícolas e florestais do Paraná, já adaptados à nova legislação estadual que regulamenta o modelo cooperativo. Com mais agilidade administrativa e uma vivência prática do cooperativismo, essas instituições estão qualificando o ensino técnico e fortalecendo o vínculo com o setor produtivo.

Idealizada pelo Governo do Estado, a implantação das cooperativas-escola tem permitido que os colégios da rede estadual adquiram insumos e equipamentos com mais autonomia, comercializem os excedentes da produção agropecuária das fazendas-escola e direcionem os lucros para a própria melhoria da infraestrutura e das aulas práticas.

É uma mudança significativa em relação ao modelo anterior, no qual os valores obtidos com a venda de produtos precisavam ser repassados ao Estado ou comercializados de maneira informal.

Na Lapa, onde a Escola Agrícola foi criada em 2004 e atualmente atende mais de 400 estudantes, a cooperativa já permitiu ações diretas como a contratação de serviços de manutenção, a compra de sementes e a aplicação de melhorias na produção de leite e hortaliças.

Para o diretor-geral do colégio, Eros Ferreira do Amaral, essa agilidade tem feito a diferença na rotina escolar. “O trator estragou no campo e conseguimos chamar o mecânico no mesmo dia, pagar pelo serviço e continuar com o plantio. Antes, teríamos que solicitar recursos ao Estado e aguardar a tramitação. A cooperativa dá esse dinamismo, sem perder a transparência administrativa”, relata.

Segundo Amaral, o envolvimento da comunidade escolar no processo de decisão reforça o aspecto pedagógico da iniciativa. “A cooperativa existe para apoiar a parte didática. Os alunos veem o que está sendo produzido, participam das decisões sobre onde investir os recursos e acompanham os resultados. Isso amplia a visão deles sobre o agro e sobre gestão”, complementa.

A participação estudantil é um dos pilares do modelo. Jonas Vega Rodriguez, estudante do 3º ano do ensino médio, já sente os reflexos. “A gente aprende na prática o que é uma cooperativa. Participa das decisões, entende os processos e tem contato com projetos reais. Isso vai me ajudar muito na vida profissional”, diz o aluno, que é venezuelano e quer seguir carreira no setor.

Para o professor de solos Marcos Pontarolo, que também é vice-presidente da cooperativa da Lapa, o novo modelo tem ampliado o interesse dos alunos e facilitado o planejamento.

“Conseguimos decidir em conjunto, entre professores, pais e estudantes, o que produzir e onde investir. Isso reduz a burocracia e melhora o aprendizado, porque o conteúdo das aulas se conecta diretamente à realidade do campo”, explica o professor. Ele destaca que a escola tem investido na produção orgânica e em sistemas agroindustriais, com a fabricação de queijos, doces, iogurtes e compotas, todos elaborados no próprio colégio.

Centro Estadual de Educacao Profissional Agricola da Lapa
Foto: Geraldo Bubniak/AEN

Exemplo mais antigo

Diferente da maioria das escolas, o Colégio Agrícola de Rio Negro já possui uma cooperativa em funcionamento desde 1982. Fundada em 1936, a unidade tem tradição no ensino técnico agrícola e atualmente atende 306 estudantes, dos quais cerca de 60% são mulheres.

Com base nessa experiência, a unidade está adequando sua estrutura jurídica à nova regulamentação, servindo como exemplo dos benefícios que essa organização pode trazer.

De acordo com o diretor da Unidade Didática Produtiva (UDP), Armando Robert, a cooperativa permite atender melhor às necessidades da escola. “Trocamos um tanque de 500 litros por um de 1000 litros para armazenar leite com mais eficiência. Parte dos recursos veio da venda do equipamento antigo e parte da cooperativa, que também emite nota fiscal e cuida dos trâmites legais da comercialização”, detalha.

“Também conseguimos comprar mais ordenhadeiras e medicamentos com agilidade, de acordo com a necessidade dos animais. Isso melhora o processo de ensino, porque garante que os professores tenham todos os insumos necessários para as aulas. A manutenção do trator, por exemplo, passou a ser feita com recursos próprios, garantindo que os equipamentos estejam sempre operacionais para o uso nas aulas práticas”, completa.

A escola também organiza um plano mensal de insumos com os professores, utilizado para aquisição de produtos aplicados nas atividades em campo e em sala. O excedente da produção agropecuária é comercializado com outras cooperativas e mercados da região.

A estudante Maísa Niejelski, de 17 anos, é uma entre 189 estudantes que vivem no internato do colégio. “A gente tem contato com os maquinários, com os animais, e isso nos prepara para sair daqui com um diferencial. A cooperativa ajuda nisso, trazendo mais estrutura e tecnologia para o colégio”, afirma.

O colega dela, Andrey Lüders, vê o modelo como um diferencial para o futuro profissional. “O que a gente não vê aqui nas aulas, a gente vê nas visitas técnicas, nas cooperativas. A ideia é sair daqui e aplicar esse conhecimento no mercado. Essa experiência é um grande passo”, diz.

Expansão do modelo

O novo modelo de cooperativa-escola foi implementado oficialmente pelo Governo do Estado em 2023, com a sanção da lei estadual 21.554 e sua posterior regulamentação, oficializada pelo governador Carlos Massa Ratinho Junior em 2024.

A proposta é permitir que as escolas agropecuárias da rede estadual atuem como unidades produtivas com personalidade jurídica própria, mantendo o foco pedagógico. Atualmente, 21 colégios já funcionam com a nova estrutura e outras cinco unidades estão em processo de adequação.

A medida tem gerado impactos também em colégios como o Centro Estadual Florestal de Irati, que usou recursos próprios da cooperativa para adquirir uma granja para suinocultura com tecnologia alemã de conforto animal, a primeira vendida pela empresa Sistemilk no Brasil. A compra foi fechada durante o Show Rural Coopavel deste ano.

Além disso, caravanas de estudantes têm participado de feiras técnicas e apresentado projetos desenvolvidos em sala de aula. Em Clevelândia, por exemplo, alunos expuseram um aviário automatizado. Já em Nova Aurora, estudantes relataram o impacto de conhecer tecnologias diretamente com as empresas.

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