Documentário sobre Terra Nova resgata memória da imigração alemã no Paraná
Conteúdo produzido por Alexandra Allover ultrapassa 64 mil visualizações em cinco dias e desperta interesse de visitantes pela colônia de origem alemã
Emerson Teixeira
Castro – Mini documentário sobre a Colônia Terra Nova, no interior de Castro, produzido pela jornalista austríaca Alexandra Allover, alcançou mais de 64 mil visualizações em apenas cinco dias em seu canal no YouTube e passou de 400 comentários, despertando interesse de visitantes e ampliando a visibilidade da comunidade. Terra Nova foi a primeira colônia que a jornalista visitou no Paraná dentro de uma série de reportagens sobre imigração no Estado.
Alexandra esteve na região em novembro, acompanhada por Newton Schner Jr., morador de Ponta Grossa, que faz parte do Centro de Línguas Germania e do portal Südbrasilien, responsável por aproximá-la da comunidade. Foram ele e Douglas Tomachewski, que costuma também receber grupos de alemães e fez parte do doutorado em Berlim, quem a levaram à colônia alemã em Castro. “Nós estivemos com ela no dia 22 de novembro. Foi um dia todo gravando em Terra Nova. Fomos à casa do Alexandre Hubert, que foi um dos principais entrevistados, depois fizemos um tour pela colônia, visitamos o museu e, por último, ela ainda entrevistou a professora Gudula Maus. Aí, como apoio, foram fornecidas algumas imagens de outras festividades, como a festa da colheita”, relatou.

Segundo Schner, a aproximação começou por meio de amigos em comum. “Nós nos conhecemos através de uma amiga de Curitiba. Eu já acompanhava o trabalho da Alexandra e até havia escrito algo a respeito, porque eu cuido de um portal de cultura alemã e tenho muito contato com pessoas de lá. Fui até Curitiba para encontrá-la e, como ela estava com a agenda mais livre, sugeri que viesse aos Campos Gerais, assim poderíamos programar algumas coisas para ela”, contou.
A vinda se estendeu. “Acabou que ela veio em novembro e vai ficar até janeiro em Ponta Grossa. Nesse tempo ela participou de um evento de conversação de alemão (Stammtisch), teve uma fala na Biblioteca Paranista Eno Teodoro Wanke da Academia de Letras dos Campos Gerais, visitou nossa escola Centro de Línguas Germania e participou de várias aulas falando com os alunos em diversos idiomas, conheceu um pouco mais da nossa culinária local, encontrou muitas pessoas, visitou Terra Nova, esteve vários dias entrevistando pessoas e visitando lugares em Entre Rios, e agora em janeiro pretende visitar Witmarsum”, disse.
A jornalista, “originalmente da Áustria, da mesma região do Arnold Schwarzenegger”, como relembra o amigo que a recebeu, vive há cinco anos na América do Sul, trabalha como nômade digital e youtuber, com foco em comunidades de língua alemã no continente. “Ela também escreve para jornais da Áustria e do Paraguai”, completa Schner.

A reportagem do Página Um News conversou com Alexandra na terça-feira (23). Ela contou parte de sua trajetória, experiências na América do Sul e declarou-se apaixonada pelo Brasil. “Nasci na Áustria e falo alemão. Comecei a trabalhar na América do Sul há mais de cinco anos, visitando os melhores lugares para viver e viajar, e escrevendo sobre eles”, afirmou.
Com o tempo, ela percebeu uma lacuna histórica. “Com o tempo, percebi que existem antigas colônias europeias aqui, e comecei a me perguntar por que não aprendemos quase nada sobre elas quando crescemos”, disse. A partir daí, veio a decisão profissional: “Então decidi fazer disso a minha missão: contar às pessoas na Alemanha e na Áustria sobre essas colônias. Descobri que a maioria nunca tinha ouvido falar delas”.
Alexandra já produziu reportagens sobre Dreizehnlinden (Treze Tílias), em Santa Catarina, além de Blumenau e Pomerode. No Paraná, visitou Terra Nova e Entre Rios, e planeja conhecer Witmarsum em janeiro. “Escrevo para diferentes jornais e portais online, e também tenho meu próprio canal no YouTube (‘Alexandra Allover’), onde mostro como pode ser a vida na América do Sul”, explicou.
Sobre a experiência em Terra Nova, ela resume como marcante: “Por meio do meu amigo Newton, consegui contatos em Terra Nova. Visitar o local foi como uma viagem no tempo, para uma época mais tranquila. As pessoas valorizam coisas importantes, como comida caseira, e mantêm seus valores culturais, como a dança e o coral da igreja”.

A língua também chamou atenção. “O alemão falado lá me chamou muita atenção. Não é tão misturado com gírias ou linguagem coloquial. Dá para perceber que eles se esforçaram muito para manter o idioma alemão de forma tradicional”, relatou. Segundo ela, os moradores “pareceram muito hospitaleiros, honestos e genuinamente interessados na própria história”.
Alexandra observou com preocupação a transmissão geracional do idioma. “O lado triste é que a terceira geração parece ser a última a ainda falar alemão. Mesmo assim, eles fazem um grande esforço para transmitir a história. Alexandre Hubert criou um novo museu muito bonito, um ‘Kolonistenhaus’ (casa de colono), que mostra como os pioneiros viviam”.
Ela também entrevistou a antiga professora da colônia. “Também tive a oportunidade de entrevistar a antiga professora da colônia, Dona Gudula Maus (nascida em 1938). Ouvir suas histórias sobre como era crescer ali me deixou muito grato por ter conhecido um lugar tão desconhecido e pacífico”.

A jornalista passou ainda por Entre Rios. “Também passei uma semana em Entre Rios, com os Donauschwaben (Suábios do Danúbio). Foi uma experiência bem diferente de Terra Nova, pois tudo ali parece maior e mais desenvolvido, especialmente por causa da cooperativa Agrária”, comparou. Para ela, o respeito à memória é traço comum: “Tanto em Terra Nova quanto em Entre Rios, as pessoas respeitam muito sua história e gostam de relembrá-la”.
O vídeo sobre Terra Nova, publicado em alemão com legendas em português, vem despertando interesse turístico. “Já publiquei um vídeo sobre Terra Nova no meu canal do YouTube ‘Alexandra Allover’ e atualmente estou trabalhando em uma reportagem sobre Entre Rios. Em breve, também sobre Witmarsum”, afirmou. Em muitos comentários, segundo ela, há pessoas manifestando desejo de conhecer a colônia.
No documentário, Alexandra contextualiza a história local: “Terra Nova é uma colônia alemã pouco conhecida no sul do Brasil, localizada no município de Castro, no Paraná. Fundada entre 1933 e 1936 por cerca de 160 a 170 famílias vindas de diferentes regiões da Alemanha, a colônia recebeu imigrantes majoritariamente urbanos — açougueiros, engenheiros, padeiros — que, como condição para emigrar, precisaram se dedicar à agricultura, mesmo sem experiência prévia”.
Os primeiros anos foram de adversidades. As famílias enfrentaram terras secas, moradias simples, falta de infraestrutura e décadas sem energia elétrica. Durante a Segunda Guerra Mundial, a Lei da Nacionalização proibiu o uso do alemão e manifestações culturais e retirou a administração alemã, deixando moradores sem títulos de terra. Ainda assim, a comunidade resistiu, reorganizou a produção agrícola e se fortaleceu na pecuária leiteira e nos grãos, com apoio do espírito comunitário.
Hoje, os descendentes de terceira e quarta gerações mantêm museu, igreja e tradições culturais, enquanto o idioma alemão resiste sobretudo entre os mais velhos. Para Alexandra, o futuro passa pela combinação entre campo e turismo: “As colônias não vivem apenas da agricultura, mas também do turismo. Elas gostam de receber visitantes e fazer visitas guiadas pelas colônias e pelas igrejas, e também organizam festas que mostram aos turistas como as festas alemãs são celebradas, com dança, canto e bolos típicos alemães”.
A jornalista deixa um desejo para quem vive ali e para quem assiste aos seus vídeos: “Espero que as novas gerações pelo menos aprendam o que seus bisavós conquistaram e como eles ajudaram a construir esse Brasil incrível, que se orgulha de suas diferentes culturas”.
